BILINGUISMOS: SUBJETIVAÇÃO E
IDENTIFICAÇÕES NAS LÍNGUAS MATERNAS E ESTRANGEIRAS
Os pesquisadores do
bilinguismo têm desenvolvido uma reflexão acerca das posições do sujeito
construídas pelas/nas diversas formações discursivas às quais o sujeito se
identifica e se ressignifica, de forma
que processos identitários estejam relacionados à educação bilíngue. O objetivo
desta resenha é ressaltar a abordagem psicossocial da comunicação bilíngue.
“O
contrato-confronto-conflito com outras línguas ou, até mesmo, com o
estrangeiro/estranho que habita nossa própria língua, mobiliza momentos de
identificação e de desidentificação e, por conseguinte, propicia diferentes
modos de subjetivação resultantes de impasses subjetivos ou da experiência
singular que cada um tem com a linguagem que nos é anterior” (p.21- 22). Ser
bilíngue tornou-se uma necessidade normal e extraordinária no mundo em que
vivemos. As línguas e mesmo as escolhas linguísticas não podem ser consideradas
meios de comunicação neutros. A comunicação bilíngue acontece, tendo em vista o
contexto sócio-histórico dos participantes. Esse aspecto psicossocial é
relevante na transformação do sujeito no contato com outras discursividades.
Se a língua materna e
mesmo a estrangeira são construídas de forma representativa pelo sujeito, o
nível de conhecimento de uma língua ou seu grau de instrução tornam-se
independentes no processo de aquisição de LE. Na aquisição de uma segunda
língua, o sujeito começa a relacionar-se com a língua materna de outra maneira.
É certo que os bilíngues alternam a língua, quando não encontram a palavra
certa no momento de uma enunciação. A alternância linguística faz parte da
abordagem psicossocial.
Uyeno e Cavallari relacionam
a língua à questão do desejo. Desse modo, o estudo das representações e do
desejo das/pelas línguas em contextos bilíngues, leva em consideração as
relações de poder entre as línguas em sua exterioridade histórico-social. Pêcheux
chamou de homogeneidade lógica essa necessidade do sujeito pragmático (2002, p.
33), cuja posição impõe um controle sobre duas línguas que se tornam “suas”,
que deverão ser “utilizadas” por ele com “destreza” e “perfeição”. A língua
estrangeira é vista, portanto, como uma lugar de desejo. “Língua estrangeira como um lugar
de desejo e, ao mesmo tempo de risco de exílio, em relação à língua dita
materna” (REVUZ, 1998 (p. 254)).
Ao reduzir as línguas a essa função pragmática
da comunicação, o funcionamento discursivo acaba por excluir o sujeito dessas
línguas, uma vez que, na posição de sujeito pragmático, não há lugar para sua
inscrição3 na língua e, assim, “o idioma é tratado como um produto que funciona
fora do sujeito, não fazendo parte de sua constituição identitária” (SIQUEIRA,
2009, p. 50). A relação sujeito-língua é marcada pela responsabilidade do
sujeito no seu ato enunciativo, que, por sua vez, se configura pelo contexto
social/afetivo imediato da produção linguística. O sujeito, então, é convocado
a assumir uma posição de controle total sobre suas intenções e emoções no
processo de uso da língua, reduzido à “interação comunicacional”.
Na interação
comunicacional, observa-se o quanto a aprovação do interlocutor pode ser
importante na enunciação, dado o grau de previsibilidade do outro, da atração
por semelhança, a fim de que o entendimento se estabeleça mutuamente. Assim, o
desejo de cada indivíduo, ao enfatizar sua própria diferença em relação ao seu
interlocutor, sinaliza uma identidade mais do grupo a que pertence esse
indivíduo do que da sua própria identidade pessoal. Por isso, o fator
estrangeirismo muda, porque diz das relações simbólicas e imaginárias que o
sujeito construiu ao longo da sua história.
No
processo ensino-aprendizagem de línguas, o contexto sociolinguístico considera
vários processos psicossociais como mediadores, que vão desde a troca social, o
envolvimento dos interlocutores e a identificação social (contexto) até a
formação de estereótipos, já que a comunicação bilíngue envolve grupos
etnológicos diversos, com diferentes status, de ambientes com maior ou menor
prestígio social. A troca de culturas, o processo de aculturação também dizem
da integração social.
No curso da comunicação,
considerei as crenças individuais no que diz respeito ao contexto dos grupos e
os ambientes sociolinguísticos em que os sujeitos bilíngues estão inseridos. A
abordagem psicossocial permite entender um pouco sobre o comportamento
bilíngue. Dessa forma, contexto não é somente o ambiente externo. O contexto é
um elemento da cognição. Eu diria que a crença dos docentes na aprendizagem
refere-se àquilo em que acreditam e sabem ao ensinar línguas, o que determina
suas ações bem como a dos alunos numa relação de causa e efeito.
Esse
estudo contribui enquanto análise crítica das crenças que envolvem professores
e alunos na comunicação bilíngue. Se o que difere o adulto cuidador e agente de
linguagem do professor de línguas, pensando no processo de aquisição da
linguagem, é o fato de o professor acreditar ser capaz de transformar a língua
estrangeira em um objeto instrumentalizável, otimizando o ensino, o educador
pode, portanto, transformar o ensino. Se ele consegue contribuir no
desenvolvimento dos aprendizes, certamente, estará contribuindo com o seu
próprio desenvolvimento.
PÊCHEUX, M. Papel da
memória. In: ACHARD, Pierre. [et. al.]. Papel da memória. Trad. Introdução:
José Horta Nunes. Campinas, SP: Pontes, 1999.
SIQUEIRA, A. P. B. L.
Representações de proficiência e a construção do inglês como língua necessária
na pós-graduação. 113 p. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Filosofia, Letras
e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2009.
UYENO, Elzira Yoko;
CAVALLARI, Juliana Santana (orgs.). BILINGUISMOS: SUBJETIVAÇÃO E IDENTIFICAÇÕES
NAS/PELAS LÍNGUAS MATERNAS E ESTRANGEIRAS. Campinas, SP: Pontes Editores, 2011.
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO- FALE-UFMG-2013
Contribuições da perspectiva discursivo-psicanalítica na formação
de professores bilíngues