Estamos na semana de comemorações folclóricas por todo país. Ainda permaneço estática, visualizando um catálogo de manifestações populares que desengaveto de vez em quando, no desejo de festejar o Brasil.
Com toda sua riqueza literária e linguística, reencontro as marcas do tripé que se instalou na nossa cultura geral e foi ganhando suas ramificações ao longos de cinco séculos.
A imagem indígena foi se transformando e , embora não desejássemos que acontecesse, vai virando memória nos seus muitos aspectos consideráveis.
Eu ainda encontro alunos meus no sexto ano que pensam que índio come gente viva no Norte do país. Recorro a um culinária que virou aprendizado e tempero nobres para a Sinhá ,tentando me salvar. Das muitas tribos e guerreiros, da safra de Iracema , a virgem dos lábios de Mel, ficou um tributo literário romântico dos mais genuínos e relativos que conheço. Da índia idealizada para um homem branco que passou por aqui e se mandou no desfecho da obra.
Adiante, o negro ou mesmo o mulato que , superficialmente, coloco no mesmo contexto, tem a interface da escravidão. O período áureo nos foi tão lindamente reforçado no prego e você corre ali na TV e ainda cata algum rosto enegrecido como o meu na tela.Tirando o período do carnaval, em que o negro torna-se símbolo do samba e do Axé, da capoeira e dos quitutes de temporada, não avistamos ainda a pele negra em cenas e comerciais de exibição de trabalho, sucesso e igualdade. "Essa carta de alforria que não chega nunca ainda vai nos matar de tédio."
O europeu sempre teve costas largas por aqui. Desde 1500, no sentido pleno da colonização, entendo que ainda hoje, formamos uma aldeia colonizada pela supremacia capitalista. Na lista dos emergentes, ainda sobrevive a infiel cultura do importado. Sabe aquela famosa expressão inglesa american way of life ? Pois bem. É ela que (des)governa nosso patrimônio cultural. Eu ganhei ontem um blu-ray de presente e confesso que tive confusões ópticas. Ganhei um raio azul. É isso ! Estou na moda. Em outras palavras , iniciei ali minha guerra pessoal de formatos.
Nessa viagem de memórias, valeria rever aquela foto grotesca e inédita no álbum, contendo uma senhora no interior de Minas, dando-me receita de mato para curar dor de barriga. Esse formato sim , não se recupera. Suas fontes orais, no boca a boca que virou a procissão de causos e receitas, estão crescendo para dentro dos livros. Começaram a ganhar registro e não têm sequer uma autoria própria.Tenho saudade de um lado B.
É isso que dá condição de respeito ao aspecto folclórico do meu povo : a indefinição é virtude autoral. Uma que contou para a outra, que para outra contou e, ao final, todo mundo soube de forma incrementada. O conto vai se refazendo a cada geração. Mas ninguém sabe quem contou primeiro.
São essa invenções populares, que não podem ser reproduzidas em pequenos discos azuis , que dão glória à nossa história tupiniquim. Andamos numa velocidade horripilante, mas não perdemos o trem. Mineiro é assim: tem medo de perder e não perde mesmo.Ele finge que.Vale até a indefinição abrangente lexical do termo. Um trem pode ser qualquer coisa. Desconheço morfologia mais rica.
Depois dessa, ainda sento-me para provar o café em uma starbucks e começo a listar quantos tipos de cafés e sabores, os europeus estão colocando no nosso cardápio. De longe, eu sei que o café preto é que é o bom.
Somos ricos dessa miscelânea cultural e pagamos o seguro pela sua preservação, toda vez que alguém leva para a sala de aula uma história sobre negros, índios e portugueses. Depois desse trio, outras histórias foram incorporadas ao nosso idioma, que
"colonizado", tem se libertado na música, na oralidade e nas artes em geral . Essa parte do periódico folclórico é a comunicação facilitada para entendermos tantas razões que versam sobre uma terra que tem palmeiras, onde canta o sabiá .
"colonizado", tem se libertado na música, na oralidade e nas artes em geral . Essa parte do periódico folclórico é a comunicação facilitada para entendermos tantas razões que versam sobre uma terra que tem palmeiras, onde canta o sabiá .
Aquela terminação poética do Não permita Deus que eu morra sem que eu volte para lá é um hino.É o hino do Brasil lobista , das propinas e dos laranjas, do empresariado "mandante" e do operariado "obediente". É o segundo hino do oitentão "Vocês vão ter que me engolir..." No salve-se quem puder, é o hino do despencamento do ministério republicano pós-lulático.Isso se já não houve atualização ...
No fundo desse buraco sem fundo, o que o brasileiro quer é usar sua identidade aqui e acolá, sem fronteiras. Eu bem que procurei no álbum , mas acabei encontrando canguiços por toda parte e pardais desassossegados no fio de alta tensão, esperando a poeira abaixar para deixarem o exílio em que se encontram.
Professora Marília Mendes