"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa.
Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A
gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."
“Toda a obra de Clarice é
epifânica, e não existe quase ninguém que faça igual a ela. Temos James
Joyce, cujas epifanias são muito ricas, lançando mão das metáforas de
colisão, como as que Clarice usa. As metáforas de colisão agem segundo o
princípio da tensão e da oposição. São metáforas mais aprimoradas, mais
difíceis de serem percebidas”.
(Paulo Carvalho, do Diário de Pernambuco)
Assim como o poeta Carlos Drummond de Andrade ganhou o seu dia D ( 31 de outubro ) e a partir de 2012, em 27 junho teremos o dia de Guimarães Rosa , a Editora Rocco e o IMS ( Instituto Moreira Salles ) resolveram comemorar , especialmente hoje, em 08 capitais federais, a Hora de Clarice.
Para o psicanalista Carlos Eduardo Carvalheira, que acena para intersecções entre a escritura de Clarice e noções centrais da psicanálise lacaniana: “Nesta relação entre literatura e psicanálise, há algo muito importante e mais presente na psicanálise lacaniana, que é a noção de ‘real’. Clarice fala deste mesmo ‘real’ lacaniano, mas poeticamente. Lacan, por exemplo, coloca o ‘real’ como aquilo que não deixa de se inscrever; e Clarice diz, por exemplo, ‘Capta essa coisa que me escapa e, no entanto, vivo dela; e estou à tona de brilhante escuridão’, dando conta de algo indizível, atingindo o mesmo ‘real’ com as palavras”.
A obra de Clarice narra as angústias do homem, talvez da forma mais cuidadosa entre todas as formas de narrar que conhecemos, no que diz respeito à relação humana e o sentimento expresso na escrita. A forma cuidadosa da ucraniana que se abrasileirou de corpo e alma, no aniversário de sua morte, datado em 09 de dezembro, é reverenciada de hora em hora por todo país e nos outros dias, tem suas inúmeras horas de leitura e apaixonantes interseções. Clarice é, sem dúvida, a diva das nossas confissões literárias mais pertinentes.
Lembremos Clarice !Lembremos a estrela !
( Professora Marília Mendes )
Precisão
O que me tranquiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.
O que me tranquiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.
Meu Deus, me dê a coragem
de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
todos vazios de Tua presença.
Me dê a coragem de considerar esse vazio
como uma plenitude.
Faça com que eu seja a Tua amante humilde,
entrelaçada a Ti em êxtase.
Faça com que eu possa falar
com este vazio tremendo
e receber como resposta
o amor materno que nutre e embala.
Faça com que eu tenha a coragem de Te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo.
Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços
o meu pecado de pensar.
Mas há a vida
Mas há a vida que é para ser intensamente vivida, há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata.
Amor à Terra
Laranja na mesa. Bendita a árvore que te pariu.
Poemas de Clarice Lispector
...Que minha solidão me sirva de companhia. que eu tenha a coragem de me enfrentar. que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.
Poemas de Clarice Lispector
Sou uma filha da natureza: quero pegar, sentir, tocar, ser. E tudo isso já faz parte de um todo, de um mistério. Sou uma só... Sou um ser. E deixo que você seja. Isso lhe assusta? Creio que sim. Mas vale a pena. Mesmo que doa. Dói só no começo.
Estrela perigosa
Estrela perigosa Rosto ao vento Marulho e silêncio leve porcelana templo submerso trigo e vinho tristeza de coisa vivida árvores já floresceram o sal trazido pelo vento conhecimento por encantação esqueleto de idéias ora pro nobis Decompor a luz mistério de estrelas paixão pela exatidão caça aos vagalumes. Vagalume é como orvalho Diálogos que disfarçam conflitos por explodir Ela pode ser venenosa como às vezes o cogumelo é. No obscuro erotismo de vida cheia nodosas raízes. Missa negra, feiticeiros. Na proximidade de fontes, lagos e cachoeiras braços e pernas e olhos, todos mortos se misturam e clamam por vida. Sinto a falta dele como se me faltasse um dente na frente: excrucitante. Que medo alegre, o de te esperar.
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