“Quem pensa o contrário, como eu, está na contramão.
Eu prefiro estar na contramão.”
( Márcia Tiburi)
A era tecnológica surpreendeu o mundo e dele, fez inúmeros reféns dos romances efêmeros, sem muita afetividade. Fico observando as mensagens trocadas nas redes sociais, o vocabulário condizente com a falta de desejo de compromissos mais sérios e com a menor importância com que se têm tratado os relacionamentos. Vou me sentindo ultrapassada, fora de moda e me pergunto, no íntimo, será que os novos romances descartáveis, que surgem por aí e que, em geral, nem vingam tanto assim, são , de fato, tão fascinantes ? E o que se torna sério para uns pode nem parecer tão sério para outros.
O meu mais novo amor é também o mais velho. É aquele que eu esperava sem saber se vinha. É um amor de namorado que lê além das palavras. É muito culto e sincero e fala dois idiomas. Está presente, mesmo quando não está , porque sempre que se vai, deixa um escape na memória.
De longe, aquelas mensagens de amor passageiro, cheio de dúvidas, sempre "inbox" para não dar o que falar, são os que se calam mais cedo. Não emplacam, porque consistem apenas no prazer ilusório do sexo. Compartilham posts que já foram compartilhados. Nada originais, são modelos copiados, refabricados em rede.
Surpreende-me, dizendo de uma vez, com os olhos fixos nos meus, que o amor é grande e cabe numa janela sobre o mar. Interpreta Drummond, serve o meu jantar e entende de bons drinks para todas as ocasiões. Também me fez entender de vinhos e gastronomia.
Mandou-me ontem à tarde, um convite para o mais novo lançamento da Márcia Tiburi em São Paulo e chamou-me duas vezes de "sua". No entanto, ele adia as redes sociais e prefere ler suas cronocríticas e ouvir Chico, que ele coleciona com gosto.
Nossos cafés são sempre exuberantes. Ele sabe contar piadas e é personagem de cada episódio. Para na rua e me faz rir das pequenas e mais insignificantes banalidades. Quando fala ou canta em Inglês, sempre me ensina um verbo novo, um tempo novo e olha-me com olhar de Keanu Reeves na Casa do Lago.
A saga dos novos romances não compactua com troca de olhares. Não há aquele momento do " antes ", que trocamos sem pressa, mas com sofreguidão. E se não tem o antes, dificilmente, terá o depois. Naquele tempo, os casais ficavam dias à espera de um contato tátil, que ultrapassasse o visual. Era mágico sentir a palma da mão no rosto, como num deslize imperdoável para o pescoço. Os beijos eram segredados em momentos muito particulares , sem a superficialidade dos afoitos beijos de ficantes no desespero do fim de noite.
Por contrastantes características, vivo um novo caso de amor e o conceituo como namoro. Porque merece a continuidade dos dias da semana, dos meses, porque espera ser mais do que é, porque criou-se num respeito mútuo inegável, me faz confiante daquilo que quero ser e é confiável naquilo que é.
Vez por outra, eu me pego ficando com esse namorado, porque estamos sempre nos achando corajosos demais para irmos ao cinema ao meio dia, comendo pipoca juntos, ficando em casa em dias de chuva ou assistindo aos vídeos dos Beatles pela centésima vez. De vez em quando, quando falta a coragem, nos escondemos um no outro, fingindo aqueles atletas, no fim de tarde , sem pressa de fazer nada e sem nada para fazer com pressa.
A coragem de deixar o outro livre é nosso principal elemento, porque quando um do outro se distancia, é que damos asas às infinitas possibilidades do termo . É quando abro um livro sobre a mesa, e leio na escrita fina e clara, com que ele evidencia na primeira página : para minha namorada. Motivo de constatação. Prazer que se adia e que chega com todos os encantos. Lá longe, no céu, voando alto, ele é capaz de adivinhar como estou sorrindo, mesmo quando não estou.
Marília Mendes