07 agosto 2011






Sempre que se aproxima o dia dos pais , começo a repensar a ideia do escritor Jack Bianchi : 
 
Desde aquele tempo, uma coisa ficou bem clara pra mim: Mãe é chão. Pai é teto.
Minha mãe era a emoção, a chamada de atenção mais enérgica, o ensinamento diário, o acompanhamento escolar. Sofria com as nossas ‘tristezas infantis’ e vibrava com nossas ‘pequenas conquistas’. Era ela quem dizia como comer, como falar, como tomar banho, como se comportar na frente dos outros. ’Se matava’ por nós e sempre muito feliz por isso. Meu chão.
Meu pai era o provedor. Nunca deixou faltar nada para os filhos. Os melhores colégios, as melhores roupas, os melhores brinquedos, as melhores férias. ‘Se matava’ por nós e sempre muito feliz por isso. Meu teto.
Não conseguia imaginar uma troca de papéis. Teto é teto. Chão é chão. E pronto.”


O fragmento me vem como contraprova do contexto familiar atual. Os pais teto estão muito semelhantes às mães chão e vice-versa. São pais que desempenham o papel do pai e da mãe ou o seu contrário. São pais separados que se viram nos trinta para dar conta do duplo  ofício.
Embarcando com atraso no aeroporto de Brasília recentemente, vi e 
segui a cena : um menino , com pouco mais de sete anos ,puxava a camisa do pai e apontava para o painel, indicando o 
voo . Ele insistiu muito, até fazer o pai voltar-se para o aviso e dar-se conta de que era a última chamada. Última chamada ? Como assim ? Não podia ser... O pai leva um choque e agradece ao filhão pelo lembrete. No embarque, já acomodados, dividi o espaço com os dois e foram mais de sessenta minutos de história. Ele, o pai, sem nenhuma cerimônia, comunica que quase perdera o voo e que ainda estava meio confuso. Perdera a esposa há três meses e ainda não sabia como lidar com o filho. Estava se sentindo meio sem jeito. E daí? -Pensei comigo mesma.

Ouvi com disposição aquele relato. Suas lágrimas acompanhavam um falar meio confuso, desorganizado pela circunstância em um rosto  com aproximadamente quarenta. Ele se lamentava e repetia algumas vezes que ser pai e mãe seria uma difícil tarefa. Não se sentia preparado. Durante todos aqueles anos, ele trabalhou para ser o provedor e que teve que aprender a ser mãe e a desempenhar o papel do chão ( era o que me vinha à cabeça). A chamada de atenção enérgica de que nos fala o escritor incluía aquela vantagem que as mulheres têm com os filhos. Elas são tão atenciosas. São de Vênus. Eu imaginava, fazendo alusão a outra literatura. Os homens são de Marte. Constatei... 
O pai que ele era , fazia dele o dono do dinheiro. Pagava as contas. Supria. Era o teto. O  que é um teto, por mais firme que seja , sem um chão? Indaguei.
E comecei a pensar demais. Pensei no meu pai e na minha mãe. Com mais de setenta, eles vêm segurando o alicerce dos filhos e estão cansados. Eu tenho o teto e o chão e por mais que eu tente me estruturar entre as extremidades, eles não podem deixar de ser minha referência.


A arquitetura da história a bordo parecia se encontrar com a realidade em solo. Por outro lado, identificava neles, pai e filho, um exemplo de milhares de histórias de filhos que terão a referência concreta ou de um teto ou apenas do chão e nem por isso, perderão o direito à felicidade.

O menino levantou o braço e de soslaio , chamou a atenção do pai. Queria um agasalho. Estava frio na aeronave. O pai se justifica: Até isso estou aprendendo.
Muitas coisas ele terá que aprender. As crianças de hoje vivem em estruturas muito comuns. Faltam-lhes o teto ou o chão, mas elas são erguidas com muita coragem. O homem separa-se da sua mulher. Pai e mãe não. Não se separam nem quando um vai antes da hora. Indicativo pretérito para a eternidade. São pais que reaprendem muitos conceitos e que se aprontam, sem muita percepção, para se tornarem avós . 

O tempo passa muito rapidamente e um simples descuido ou um ocasional despreparo pode ensinar ao teto que às vezes, é preciso ser o chão ou que o chão pode se moldar ao teto. Não há divisões. Educar terá sempre essa linha tênue arquitetônica. Entre os polos, erguem-se os filhos. Eles vão tremer na base durante muito tempo, mas o ensinamento dos pais será sempre a cartilha que vai falar mais alto. Ainda que alguns reparos sejam necessários, díspares, eles servirão de reboque para nos conduzir a alguma paisagem. Eu, humildemente, acrescentaria que os pais são uma espécie de tríade vitruviana . São donos do design do nosso caráter.
Feliz dia dos pais a todos que fazem parte da arquitetura estética à qual me refiro. Felizes construtores dos nossos edifícios clássicos, com ou sem o bedelho da modernidade.
Beijo papais. Vocês merecem ! 
                               Marília Mendes